Saturday, August 19, 2006

Confabulando

Chegou morta de fome. Foi pro fogão, cozinhou o pouco que tinha na geladeira e errou. Errou a mão no sal. Errou feio. A pouca comida que tinha ficou intragável. Sem grandes metáforas. Apenas isso. A comida insuportavelmente salgada. Comeu. Assim mesmo. Estava com muita fome, que fazer... Isso não tem nada a ver com a história. Por que isso agora? Não era nada disso. A história não era essa... Talvez a parte do intragável. Nisso era parecido. Enquanto comia o tijolo de sal pensava porque não tinha dito. Por que não tinha dito? Ele estava ali tão perto...tão perto que ela poderia tê-lo matado. Ou lhe acertado um belo soco no nariz. Não seria engraçado? Ela, tão madura, tão compreensiva, amiga, divertida. O parque de diversões de porta sembre aberta, que lhe tivesse jogado a roda gigante na cabeça? Um belo soco no nariz! Ficar admirando o sangue escorrendo... nada de grandes histórias, despedidas, sofrimentos, apenas um soco e um palavrão. Quem sabe assim ele entendesse de fato o tamanho da dor. Do desperdício. Quem sabe não fosse seu maior desejo? Sua grande espera... Alguém que lhe socasse o nariz. Talvez assim parasse com a palhaçada de se esconder atrás do próprio autoconhecimento, do não saber o suficiente. Por quer tinha que saber tanto afinal? Não podia apenas ir ao cinema de mãos dadas? Adormecer em silêncio? Jantar a dois, andar pelas ruas, dar risada? Tudo tem que ser definitivo. Seria tão mais fácil... Seria o que mais fácil?? Não disse porque não tinha mais vontade de insistir. Porque já tinha sido demais. Queria era ter lhe socado o nariz. E perdeu a chance. Ela não era mais fácil. Era mais importante, mais verdadeira, mais alegre. Não mais fácil. O belo rapaz que não sai de trás da vidraça, embaçando tudo. E acha que fica tudo certo. Como ela disse. Tudo certo. Intragável. A vontade de explodir a sala de lágrimas, de gritos, de ódio. Como a Fênix no cinema. Transformar o professor Xavier e todos os seus bonecos em pó. De novo mentiu. Depois passou. Um copo dágua e o sal da comida se foi. Não estava mais com fome. Tudo certo.

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